Carlos
Minc (PSB-RJ) foi autor da lei que extinguiu benefício para
policiais que matavam em serviço, em 1998
Um dos decanos da Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro), o deputado estadual Carlos Minc (PSB-RJ) foi o autor da lei que acabou com a primeira encarnação da “gratificação faroeste”, em 1998.
Nesta terça-feira (23), a Alerj ressuscitou a medida. A lei aprovada de lavada no plenário da casa –com 47 votos favoráveis contra apenas 15 contrários– estabelece uma bonificação entre 10% e 150% do salário dos policiais civis que “neutralizem” suspeitos –termo policial para as mortes por intervenção policial. O jabuti foi colocado em um projeto de restruturação das carreiras da Polícia Civil por intermédio de uma emenda apresentada pela bancada bolsonarista na casa.
Agora, diante da aprovação de uma nova versão da “gratificação faroeste”, o parlamentar define como “horrível” viver de perto uma nova onda de recrudescimento do discurso linha dura na segurança do Rio.
Em entrevista à coluna, Minc faz paralelos entre o discurso político nos anos 90, que levou à criação da bonificação faroeste, e os dias atuais. Também analisa o cenário político que levou à recriação da medida e promete ir à Justiça caso o texto seja sancionado pelo governador Cláudio Castro (PL-RJ).
“O texto está praticamente pronto e consegui o apoio de outros cinco partidos”, afirma o parlamentar, que se prepara para ir ao STF contra a “gratificação faroeste”.
Ele aguarda a avaliação do governador Cláudio Castro (PL-RJ), que pode sancionar ou vetar a lei. “Tenho a intuição de que o governador vai vetar. Não porque ele não concorde com a medida, mas porque o projeto aprovado não tem duas coisas que a legislação exige: o impacto orçamentário e a fonte de custeio”, destaca.
‘A GRATIFICAÇÃO FAROESTE’ FOI CRIADA POR GENERAL DA DITADURA
Minc relembra a aposta do tucano Marcello Alencar, então governador do Rio, em um nome da linha dura da ditadura militar para lidar com a onda de violência que assolava o estado. Nos anos 1990, o Rio viveu uma epidemia de sequestros. As imagens de traficantes fortemente armados e das guerras entre facções rodavam o mundo.
“Nessa época se acreditava que bastava colocar um general para resolver o problema”. A “gratificação faroeste” foi criada por decreto, e era bem parecida com essa versão atual”, recorda o deputado.
Bastou a gratificação entrar em vigor para os índices de letalidade policial no Rio dispararem. “Logo depois começou a pipocar na imprensa, um caso aqui, outro ali [de execuções]. Amigos nossos na polícia diziam que o clima era muito ruim”.
Minc relembra que, diante das denúncias, articulou apoio da Alerj a um estudo do sociólogo Ignácio Cano, um dos mais importantes especialistas em segurança pública do Brasil, sobre as mortes cometidas durante a vigência da “gratificação faroeste”. Os resultados foram aterradores: em 1995, o número de mortos em confronto com policiais subiu para 358 – 130% a mais do que o registrado dois anos antes, em 1993, segundo o estudo de Cano.
O deputado atribui ao estudo e à repercussão de casos de execução na imprensa a janela na qual conseguiu aprovar o fim da gratificação faroeste, em 1998. Depois, o parlamentar conseguiu emplacar outras leis de controle e modernização da segurança pública nos anos seguintes.
A segurança pública do Rio viveu, ainda que com soluços em sentido contrário, uma era de profissionalização e controle das políticas públicas até meados da década de 2010.
RECRIAÇÃO COM O BOLSONARISMO
A situação, que já se degradava, degringolou de vez nas mãos de outro general: Walter Braga Netto, então interventor federal na segurança pública do Rio. Hoje ele está condenado e preso por seu papel de liderança na tentativa de golpe de Estado de 2022.
“É horrível, porque isso coincidiu com o Bolsonarismo”, diz Minc, em referência à volta do discurso em defesa da matança como política de segurança pública. Em um dos resultados mais surpreendentes da história eleitoral brasileira, o anônimo ex-juiz federal Wilson Witzel se elegeu governador do Rio em 2018 com a defesa do “tiro na cabecinha” como política de segurança pública.
Apoiado por Bolsonaro, com quem viria a romper pouco tempo depois, Witzel cumpriu o que prometeu e elevou a violência policial ao maior patamar da história do estado. Em 2019, primeiro ano de seu curto governo, foram registradas 1.814 mortes por intervenção policial no estado, o maior índice de todos os tempos. Em várias regiões, os policiais, que deveriam conter a criminalidade, se tornaram os responsáveis por mais de 50% dos homicídios.
Minc lembra que o discurso da bancada bolsonarista recupera os jargões dos deputados que defendiam a violência policial nos anos 1990. O exemplo máximo é o do ex-delegado Sivuca, pai da máxima do “bandido bom é bandido morto” e notório integrante da Scuderie Le Coq, primeiro grande grupo de extermínio do Rio.
Outro expoente dessa época era o coronel reformado da PM Emir Larangeira, apontado como líder dos Cavalos Corredores, grupo de extermínio responsável pela Chacina de Vigário Geral. “Eu fiquei cinco meses andando com escolta por causa do coronel Emir Larangeira. Eu denunciei ele para o Conselho de Ética e ele, do microfone do plenário, disse que sabia onde eu morava, onde minha mulher morava…”, relata Minc.
DISPUTA DE ‘QUE É MAIS TRUCULENTO’
Na leitura do experiente deputado, os colegas de extrema direita da Alerj tentam, às vésperas da eleição de 2026, ocupar esse nicho da linha dura: “Eles estão disputando entre eles quem é mais truculento”, resume.
Nas últimas semanas, a Alerj vem aprovando uma série de projetos de aumento de repressão –vários deles flagrantemente inconstitucionais. É o caso de um projeto de autoria do presidente da casa, Rodrigo Bacellar (União Brasil), que estabelece um tempo mínimo de 2 anos de internação para adolescentes em conflito com a lei, acaba com a visita íntima e com as saidinhas dos presos. Só o Congresso pode legislar sobre todos esses temas, segundo o MPF.
Bacellar é pré-candidato a governador. Até recentemente, era o principal aliado do governador Cláudio Castro, mas a relação entre os dois está estremecida, fazendo com que ambos disputem a aprovação de projetos na área de segurança para usarem como marca na eleição de 2026.
“Eles são o governo. Se tem insegurança, quem é responsável? Começam a fazer uma volta para dizer que eles é que combatem o banditismo. A milícia e os comandos estão deitando e rolando, ocupando metade da cidade. Eles vão botar a culpa em quem? Cadê a retomada dos territórios?”, questiona Minc.
‘Se tiro, porrada e bomba resolvesse, o Rio seria uma maravilha. E não esse inferno’, completa.
O parlamentar do PSB, que foi ministro do Meio Ambiente no governo Lula 2, acredita que o contexto político nacional também influência no favorecimento de projetos como a recriação da “gratificação faroeste”.
“A esquerda tinha perdido três pautas fundamentais: a defesa da soberania, o combate à corrupção e a segurança pública. A soberania a gente reconquistou graças a um apoio muito significativo do Dudu Bananinha”, diz, em referência à campanha do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) por sanções contra o Brasil nos Estados Unidos.
“A questão da corrupção eles também se enrolaram com a PEC da Bandidagem. Por isso, eles vão radicalizar na pauta da segurança”, completa.
Por Igor Mello
Fonte: iclnoticias.com.br

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